sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Resenha do Livro: As Misérias do Processo Penal - Francesco Carnelluti

Resenha do Livro: As Misérias do Processo Penal - Francesco Carnelluti

     Boa Noite pessoal! Hoje lhes deixo a resenha do referido livro, feita por mim mesmo em trabalho de Direito Processual Penal! 
       
INTRODUÇÃO:

No referido livro, um dos maiores juristas Italiano, o ilustríssimo Francesco Carnelutti (1879 -1965) que foi um brilhante professor, excepcional Advogado Criminalista, ajudando a criar, inclusive, o Código de Processo Civil Italiano, nos apresenta uma visão do processo penal fundamentada em anos de experiência e prática que viveu como jurista.

O autor busca analisar o processo de uma forma diferenciada, nos mostrando que existe problemas intrínsecos no sistema, fazendo deste uma falha na recuperação e na ressocialização do condenado.

Uma obra diferenciada, vez que o autor escreve de forma sentimental, fazendo breve apontamentos ao Evangelho, nos apresentando que por trás de todo recluso ainda há um ser humano igual a nós, mas a sociedade, juntamente com o Estado recusa a reconhecê-lo, portanto o processo para o condenado muitas vezes nunca terá um fim.

A obra em tela, foi escrita em 1957, é muito respeitada e ovaciona no âmbito jurídico.


     DESENVOLVIMENTO:

CAPÍTULO I - A Toga: No primeiro capítulo, autor volta-nos a atenção para como os magistrados, advogados, promotores se vestem, especialmente para a "toga" pois para ele a toga assim como o trage militar, desune e une, ela separa os magistrados e advogados dos leigos, para uni-los entre si.

Em relação ao juiz, acusador e defensor, que estão do outro lado da trincheira. Diz-se que a toga é o símbolo de autoridade ele não deveriam usá-la.

Há ainda uma breve comparação entre o Juiz e o Sacerdote bem como a Igreja e o Tribunal, pois quando estamos no tribunal deveríamos estar recolhidos como na Igreja, e quando o Juiz está julgando deve ter consciência  que as vezes se fazem de Deus.

CAPITULO II - O Preso: Para o acusado somente lhe resta a incerteza, a partir do momento que lhe coloca as algemas descobre-se o valor do homem e tudo aquilo que estava escondido vem a luz.

Perante aos homens vestidos de toga, o réu , mais parece um animal perigoso, enjaulado e exposto a uma situação humilhante e desumana.

Carnelutti acredita que todo ser humano tem em si, em maior ou menor proporção, o germe do bem, mesmo o delinqüente, que tomado pelo egoísmo comete todo tipo de delito, pois, a nossa curta visão não permite avistar um germe do mal naqueles que são chamados de bons, e um germe do bem naqueles que são chamados de mau.
            Em outras palavras, grades e algemas revelam, enquanto símbolos do Direito, a desventura e a natureza humana. Não importando se está preso pelas grades invisíveis do interior, o Direito nos mostra a miserável realidade humana.

CAPÍTULO III - O Advogado: Segundo Carnelutti o nome "Advogado" soa como um pedido de ajuda. É aquele se senta no último degrau da escada, que mesmo sendo grande, sabe que não pode nada perante ao menor dos juízes.

O advogado está sujeito ao juiz, pois ele divide com o acusado a necessidade de pedir  e de ser julgado.

Neste capítulo, o autor deixa transparecer sua compaixão diante do preso, considerando-o um necessitado. Para tanto, cita a passagem em que Cristo faz menção aos famintos, aos sedentos, aos sem abrigos, desnudos, enfermos e, sobretudo, aos presos. Faz menção que a maior  necessidade do encarcerado não é o alimento, nem as roupas, nem o teto sobre a cabeça, nem os medicamentos, mas o remédio da "amizade", do amor fraterno que, para ele, é o único alívio.

CAPÍTULO IV - Do Juiz e das Partes: Carnelutti coloca o Juiz no topo da escada, pra ele o juiz é o mais alto do ponto de vista hierárquico e merece essa superioridade.

A linguagem dos Juristas exaltam o juiz, portanto se nenhum homem se pensasse no que acontece para julgar outro homem aceitaria ser juiz. Para Carnelutti, a justiça humana é essencialmente parcial, porque o ser humano é limitado, sendo esta a raiz do problema. Desta forma, para resolver este problema se faz necessário diminuir a parcialidade, o que requer do juiz a tarefa de se conscientizar de suas próprias limitações

Portanto, para evitar que o juiz possa cometer injustiça, o princípio do colegiado é usado contra a insuficiência do juiz, no sentido de que, se não a elimina pelo menos a reduz. Pois o juízo colegiado está mais próximo daquilo que o juízo de um juiz deve ser.

CAPÍTULO V - Da Parcialidade do Defensor: Carnelutti parte do princípio da parcialidade do homem, pois cada homem é uma parte. Portanto nenhum homem chega  a alcançar a verdade, já que crê numa verdade diferente.

Julgando, o Juiz determina qual das partes detém a razão, de qual lado está a verdade.

Diante das razões e verdades apresentadas pelo promotor e pelo advogado, cabe ao juiz chegar a um conhecimento mais próximo da verdade, pela conciliação das razões que lhes foram apresentadas. Neste contexto, acusador e defensor são dois argumentadores que constroem e expõem razões, que normalmente põem o juiz em dúvida, visto que:

"Dúvida é uma palavra de sentido cristalino: dubium vem de duo." Significa que o juiz tem diante de si dois caminhos e deve se decidir por um deles; eis a sua dúvida: vou por este, ou por aquele outro? Ele precisa decidir. Mas, para tomar a decisão certa deve, antes, conhecer os dois caminho, pois, desse modo, conhecendo de antemão aonde um e outro o vão levar, poderá tomar a sua decisão bem mais seguro.

CAPÍTULO VI - Das Provas: A missão do processo penal está no saber se o acusado é inocente ou culpado. Isto quer dizer, antes de tudo, se ocorreu ou não determinado fato; um homem foi ou não morto, uma mulher foi ou não violentada, um documento foi ou não falsificado, uma jóia foi ou não subtraída?

E para saber-se disso, só se existe um modo, que é voltar ao passado e reconstruir o que quem fez , tentou de tudo para acabar com as evidências.

As provas, portanto, servem para nos guiar de volta ao passado, na reconstrução da história, o que requer um trabalho de habilidade no qual colaboram: a polícia, o Ministério Público, o juiz, os defensores e os peritos. No entanto, corre-se o risco de errar o caminho e, quando isso acontece o dano é grave, o que se exige reconstruir o passado para se decidir sobre o futuro de alguém.

Cada delito desencadeia uma série de investigações, conjecturas, informações, indiscrições. Essa degeneração do processo penal é um dos sintomas mais graves de uma civilização em crise. Neste contexto, o sintoma mais evidente é a falta de respeito ao acusado.

CAPÍTULO VII - O Juiz e o Acusado: O Juiz é também um historiador. Portanto segundo Carnelutti exige que o Juiz vá além da reconstrução dos fatos.

Num processo por homicídio, se tem estabelecido a certeza de que o acusado, com um tiro de pistola, matou um homem, não se sabe ainda dele tudo quanto for preciso para condená-lo, ele pode ter agido em legítima defesa, ou por estado de necessidade.

A missão de historiador, que a lei impõe ao juiz, torna-se mais impossível, sobretudo, quando precisa obter a história do acusado. Para tanto precisa superar a desconfiança que impede o relato sincero de sua história. Esta desconfiança só é vencida com a amizade, porém a amizade entre o juiz e o acusado não passa de um sonho. 

CAPÍTULO VIII - O Passado e o Futuro do Processo Penal:  O delito é uma desordem e o processo serve para restaurar a ordem. A verdade intuída é que o remédio para o passado está no futuro. Não outra que esta verdade intuída guia os homens para reconstruir a história.

Neste capítulo, Carnelutti nos ensina que o processo penal, ao mesmo tempo em que resgata o passado do réu, o acompanha para sempre, até mesmo depois de cumprida a pena, pois essa muitas vezes jamais acaba para o encarcerado.

Vivemos em uma sociedade onde o preconceito infelizmente é um fator presente, e o processo penal não se exime deste fenômeno social.

No momento em que o cumprimento da pena chega ao fim, no momento em que os portões da penitenciária são abertos, o encarcerado acredita que se tornou um homem livre, porém não passa de uma utopia; neste momento, se tornou um “ex-presidiário”.

       

CAPÍTULO IX - A SETENÇA PENAL: Construída a história, aplicada a lei, o juiz absolve  ou condena, isso deveria significar que é inocente ou culpado, portanto nem sempre é o que acontece, pois na maioria das vezes sociedade tem preconceito, mesmo que a pessoa seja indiciada, isso já a marcará para sempre. Toda que vez que solicitar a certidão de antecedentes criminais, lá constará e a sociedade a verá de modo diferente, o estado a verá diferente.

Quando a absolvição é dada pela não comissão do ato, ou porque o ato cometido não é delituoso, a acusação é eliminada. Quando, porém, é dada por insuficiência de provas, continua subsistindo. O processo não termina nunca e a acusação perdura sobre o acusado pelo resto da vida.


CAPÍTULO X - Do cumprimento da sentença: Em tese o processo termina quando o juiz diz a última palavra. Portanto a condenação não significa um ponto final ao processo, mas na verdade que esse vai continuar, somente a sede será transferida do tribunal para a penitenciária.

A ressocialização nos parece distante, visto que o caráter educativo pela conscientização não se faz presente.

A prevenção da prática de crimes, pelo medo, é relativamente eficaz, visto que os civis irão pensar mais de uma vez na hipótese de serem potenciais presos. Todavia, àqueles que já são vítimas do cárcere, o caráter preventivo da pena pelo medo é ineficaz, visto que para os presos, que já viviam às margens da sociedade no momento em que delinquiram, na prisão, em meio às condições desumanas às quais são submetidos, são convidados a se isolarem mais ainda no do quadro social.


CAPÍTULO XI - Da Libertação: Finalmente para o encarcerado vem o dia da libertação. Então o processo verdadeiramente terminou.

Nas palavras de Carnelutti: “O preso, ao sair da prisão, acredita não ser mais um preso; mas as pessoas não”.

Como já exposto, para nós, o crime é como uma ferida que brota naquele que o pratica, e o processo, um cicatrizador desta ferida. Para o prejuízo daquele que delinquiu, esta cicatriz o acompanhará até o ultimo dia de sua vida.

É possível inferir que é ao coração do delinquente que devemos chegar para poder curá-lo e não existem outros caminhos que nos possam conduzir até ele que não sejam os do amor.


CAPÍTULO XII - A Libertação: Ao sair da prisão, o detento sabe que já pagou por seus malfeitos e que novamente é um homem livre, mas as outras pessoas não o veem assim. Para elas, ele sempre será um condenado, quando muito dirão dele, ex-presidiário.

No último capítulo Carnelutti revela que todo aquele que um dia foi preso está fadado, pela sociedade, a ser sempre o que foi. Este tipo de pensamento é comum à maioria das pessoas, desde as mais humildes às mais cultas, sobretudo as que professam a fé cristã.

A partir desta compreensão, podemos dizer que o processo penal termina com a condenação. A pena não termina com a saída do cárcere e a prisão perpétua não é a única pena que se estende por toda a vida. Deus Perdoa, os homens não.

CONCLUSÃO:

Com base nos capítulos descritos anteriormente, o autor nos mostra que nem todos os problemas podem ser resolvidos por meio da força, da coação, mas  sim com um pouco de atenção, amor e amizade pode ser a chave.

Enfatiza que civilização, humanidade, unidade são uma única coisa, ou seja, a possibilidade alcançada pelos homens de viverem em paz, o que é um ideal alimentado por todos, bem como a ilusão de que todos os problemas seriam resolvidos quando todos os delinqüentes fossem separados da sociedade.

O autor demonstra o processo de um ponto vista humanístico, se compararmos com a atualidade hoje, a obra que foi escrita há anos, é totalmente pertinente, vez que atualmente no Brasil todos os detentos são tratados de forma horrenda, prisões superlotadas e a para uma grande parte da população "bandido bom é bandido morto". Infelizmente acredito que quanto mais tentamos progredir mais regredimos.

Quanto aos tribunais, ainda continua a mesma guerra entre o promotor e advogado, a testemunha ainda é totalmente desprotegida na realidade, pois existem leis que à protegem, mas não passa de uma utopia.

Concluindo, a obra é de extrema importância não só para juristas, mas para todos que puderem ter acesso a mesma, pois desmistifica o processo, e mostra  a realidade da lei e dos agentes que atuam na aplicação desta.


Espero que tenham compreendido!